sábado, 17 de março de 2012

Conversa ocasional

Sentou-se na cadeira de madeira da sala de espera, contemplou a rusticidade do assento, ficariam muito bem junto da sua lareira, pois embora envelhecida a cadeira cumpriria em pleno a sua função. Trajava com toda a simplicidade um blusão de fibra polar, de cor verde limão, umas calças de ganga gastas pelo tempo e uns ténis.

Com toda a espontaneidade divagou sobre as suas vivências enquanto mulher cosmopolita e amante azáfama citadina. Afinal na cidade tinha-se perdido de si mesma, tinha perdido o contacto com o ritmo da Natureza, com o equilíbrio entre o tempo para trabalhar e para pausar. Essa vivência levou-a a um estado depressivo, que apenas se esvaneceu quando procurou o equilíbrio entre o espaço citadino e a quietude alentejana. Não recorda com saudade os tempos em que se regeu pelas modas e hábitos da urbe, em que trabalhou de forma frenética para alimentar uma máquina de entretenimento. E como se de uma poetisa bucólica se tratasse elogiou a vida do campo e, à semelhança dos nossos antigos, concluiu que o ser humano deve viver em harmonia com a Natureza, respeitar os seus ritmos, contemplar a sua beleza e nela semear, cuidar e colher o alimento, que tanto pode ser para o corpo como para a alma. Nas suas palavras, a Revolução Industrial foi a responsável pela criação do ambiente frenético que transformou o mundo laboral e o ser humano no operário mecânico dos Tempos Modernos de Charlie Chaplin.

Compreendi e apoiei as suas palavras, pois ao longo da minha existência tenho procurado o equilíbrio improvável entre dois espaços aparentemente antagónicos, mas que têm os seus encantos e até a sua cumplicidade. À tardinha, após um dia de trabalho e de regresso ao conforto do lar, delicio-me com o por do sol, com o silêncio do cair da noite e com a sublime mistura de tons cor de fogo, no momento em que (quase) tudo adormece. Com o romper da aurora, as minhas energias renovam-se e com elas o desejo de enfrentar os desafios que a vida nos proporciona. Mas não abdico dos sons da civilização, do trânsito, da imensidão de gente, do infindar de prédios, da diversidade de pessoas, de personalidades, de culturas, de visões do mundo, enfim, de todo o mistério que é o ser humano e de todo o Conhecimento intrínseco…

E a conversa foi interrompida, quando ouvi o meu nome.

E algum tempo depois segui o meu caminho de regresso a casa, guardando na memória as palavras certas e verdadeiras proferidas naquela conversa ocasional sobre a Cidade e o Campo, sobre o Presente e o Passado, sobre o Futuro e acima de tudo sobre a forma como, a cada dia, podemos refletir sobre o nosso admirável Mundo.




L.C. 17 de março de 2012